Noutro dia, fui alvo de assaltantes. Fugi pelas vazias calçadas de Manaus. Terminei me escondendo no único estabelecimento comercial aberto nas proximidades. E não era tarde: a noite tinha acabado de chegar.O lugar onde fui assaltado é uma importante avenida que leva os trabalhadores e empresários para o Distrito Industrial, encarado como "ouro" pelo imaginário amazonense. Pois bem, perto dali estão um grande centro comercial, tido como o mais elitizado da cidade, e uma favela que se consolidou às margens de um igarapé.O curioso é que apesar do aparente agito, por ali não há pedestres. Os carros passam em alta velocidade. Há algum tempo, escrevi um artigo sobre o "espaço público" em Manaus, que foi publicado pelo jornal "O Estado do Amazonas". Em linhas gerais, essa cidade para encontrar um maior desenvolvimento humano tem que refletir sua própria condição. Para isso, compartilhar idéias, diálogos e conflitos com os diferentes grupos é fundamental.Reproduzo abaixo o peuqeno texto que tinha citado há pouco:
ESPAÇO PÚBLICO EM MANAUS: A DIFÍCIL VIDA DO PEDESTRE
Caminhar pelas ruas da cidade de Manaus torna-se cada vez mais desagradável. A experiência de ter quase que sob os calcanhares veículos, grandes ou pequenos, desencoraja o manauara a circular pelo espaço público. As calçadas, sempre estreitas e carentes de uma homogeneização, parecem cada vez mais sucumbir diante do avanço do uso dos automóveis e das vias construídas para o aproveitamento de sua velocidade crescente. Ora, não estou preocupado com a saúde física do morador de Manaus quando escrevo essas linhas, embora a caminhada seja de fato um exercício saudável.O que salta aos olhos é a desvalorização de um elemento primordial para a compreensão da realidade urbana e fundador da riqueza característica da vida nas cidades: a convivência, nos espaços de uso público, entre os diversos “atores sociais”, o diálogo entre personagens e grupos diferentes constituintes desse cenário que é a cidade. A desvalorização do espaço público, dessa forma, tem como significado mesmo a depreciação da heterogeneidade como um princípio para a urbe. O manauara conhece cada vez menos os espaços comuns de sua cidade, usa cada vez menos os equipamentos urbanos dela, como que impelido a um estilo de vida que leva muito mais em conta o automóvel e a freqüência a espaços dedicados ao consumo.Os espaços de consumo, por sua vez, são por princípio excludentes. Neles, os indivíduos não são iguais por sua cidadania, mas se igualam somente na condição de clientes ou prováveis clientes. Visto que os espaços para o consumo se caracterizam pela busca de um tipo de comprador, passa-se a ter uma realidade urbana compartimentada em diversos espaços para o consumo freqüentados por públicos específicos. Portanto, segmentos sociais de renda superior não convivem com segmentos populares.Mais que tudo, desvalorizar a dimensão da vida urbana do contato com o diverso, com o outro, é abrir mão do conhecimento sobre a realidade da cidade e de seus habitantes. Enclausurar-se em carros ou em “shopping centers” é fechar-se à possibilidade de estabelecer linhas de diálogo que possibilitem a construção de novas soluções para o convívio social.
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