terça-feira, 23 de janeiro de 2007

vislumbrando uma nova Manaus

Postarei aqui um pequeno artigo que tentarei publicar num jornal amazonense. Antes disso, disponibilizarei-o aqui. Trata-se de uma pequena reflexão sobre o "retrato" de símbolos da sociedade amazonense através da minissérie global "Amazônia". Tento apresentar a atualidade de se falar na ultravalorização de alguns símbolos por essa sociedade, apesar das evidentes transformações do mundo capitalista.
O que quero dizer, no fundo, é que quanto à sociedade amazonense mudaram algumas formas simbólicas, mas a essência da valorização de símbolos da cultura material ainda é muito forte.
Torço para que isso mude: só de outra forma é possível transformar um pouco a realidade.
É Isso!
Abaixo o texto:


Manaus: ontem, hoje e amanhã


Nos últimos tempos, o Brasil tem sido apresentado a um momento histórico da sociedade amazonense, através de uma produção televisiva de uma das emissoras de TV com alcance nacional. Tal momento se refere ao ápice do ciclo econômico da borracha, que engendrou o acúmulo de imensas fortunas pelos proprietários dos grandes seringais. Evidente que a mais fortuna ainda tiveram acesso os importadores da borracha que a transformavam em produtos industrializados, posteriormente revendidos aos endinheirados da borracha por um valor de mercado certamente maior.
A despeito de alguns símbolos manejados pela produção serem exagerados, salta aos olhos para os outros brasileiros a representação de um quadro de coisas muitas vezes reproduzido oralmente na sociedade amazonense. E que quadro é esse? É o do fausto econômico, do esbanjamento, do orgulho pela abundância da riqueza que circulava pelas ruas de nossa capital, mas que era obtida através do suado (e mal pago) trabalho de seringueiros espalhados pelo interior do estado. Um livro do português Ferreira de Castro de título “A selva” apresenta ao leitor a sofrida vida dos trabalhadores nos seringais.
Uma cena imaginária me acompanha desde a meninice: um rico coronel da borracha a enrolar seu tabaco com uma nota de cem mil réis. Como amazonense, nem precisei de livros para chegar a essa informação. Provavelmente, uma de minhas avós me narrou a história chegada a ela já mediada por um outro antepassado.
O que eu quero propor à análise dos leitores aqui é o seguinte: até que ponto a sociedade manauara é diferente do que foi nos tempos da borracha? Sem dúvida, os tempos do capitalismo são outros: hoje em dia um dono de um seringal não seria agraciado por tamanho poderio econômico. Certamente, ficaria acabrunhado no provincianismo de suas terras. O esbanjamento que acometeu nossos coronéis na virada do século XIX pro século XX se inseria num quadro ideológico que pintava as cores das vidas dos dândis e bon vivants. Esbanjar era um símbolo de riqueza e prestígio. Hoje, o esbanjamento já não é bem visto ou valorizado pela elite econômica.
É através dos símbolos que os indivíduos podem comunicar à sociedade o que são. Numa sociedade em que a mobilidade social é existente como na brasileira, os símbolos ganham forma que vão desde a vestimenta trajada até o celular usado. E se vêem espalhados pelas ruas da cidade tais símbolos em movimento nas mãos ou nos corpos dos manauaras. Em termos gerais, no capitalismo é melhor quem tem mais. E nisso Manaus não mudou, bem como grande parte do mundo.
Há, entretanto, um símbolo também capaz de conferir prestígio, que proporciona o acesso ao conhecimento. Tal símbolo, mais valorizado em outras partes do mundo, proporciona a quem ganha intimidade com ele a possibilidade de vislumbrar outras realidades possíveis. Mostra a história que as sociedades mais íntimas ao conhecimento e à educação conseguiram resolver seus problemas e avançar muito mais que as que não o valorizam. O símbolo, que na verdade é um instrumento, do qual trato é o livro. Se víssemos, e eu espero que um dia chegaremos a isso, tantos livros pela cidade quanto celulares e automóveis, mais rapidamente teríamos mais ciência da nossa contraditória sociedade e avançaríamos rumo a um melhor mundo.

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